Texto publicado originalmente no Jornal A Regiao, de Itabuna, Bahia.
Em poucas décadas, a Espanha passou de ser um país de emigrantes para ser receptor de um intenso fluxo migratório. Segundo o Censo 2007 do Instituto Nacional de Estadística-INE (organismo oficial encarregado de coordenar os serviços estatísticos da administração do Estado), um percentual de 9,1% da população espanhola são de imigrantes. São nada menos que 4.519,6 pessoas. Deste universo, 44,81% estão concentrados em apenas três províncias: Madri, Barcelona e Alicante.
Ao contrário de França, onde 10% da população são de nacionalidade argelina, ou Alemanha, cujo predomínio é dos turcos, a imigração espanhola é bastante variada, estando dominada, em primeiro lugar, pelos países da própria Comunidade Européia e, em segundo, pelos ibero-americanos. De fato, segundo a Secretaria de Estado para Imigração, dos estrangeiros com permissão de residência, 38% são europeus comunitários, e 30% são latino-americanos. Os campeões, no entanto, na classificação por nacionalidades, são os marroquinos (16,31%), seguidos pelos romenos (15,18%), equatorianos (9,95%), colombianos (6,39%), britânicos (4,99%), búlgaros (3,19%), italianos (3.14%), chineses (3.01%), peruanos e portugueses, ambos na casa dos dois por certo. Estas dez nacionalidades representam 67,64% do total de estrangeiros com autorização de residentes na Espanha, no final de 2007.
Quanto aos brasileiros, o número daqueles que têm apenas permissão de residência está na casa de 39.160 pessoas, de acordo com os dados de 2007. Entretanto, levando-se em consideração o Censo 2007, do Instituto de Estatística, esse número sobe para 90.161. A diferença tem explicação no fato de que, nos dados da Secretaria de Estado para a Imigração, não se leva em conta o número de “empadronados”. Este “empadronamiento” é imprescindível para matricular os filhos na escola e ter acesso ao sistema público de saúde, e se trata de um procedimento mediante o qual a pessoa se inscreve, na prefeitura, como moradora do município no qual se encontra. De acordo com os números do censo, cuja pesquisa é bem mais ampla, o Brasil ocupa o 15º lugar no ranking do fluxo migratório para a Espanha, ficando em 6º, considerando-se apenas a América Latina. Perde apenas para Equador, Colômbia, Argentina, Bolívia e Peru.
Os dados disponibilizados pelos INE revelam que o crescimento da população imigrante brasileira se deu num ritmo consideravelmente lento até 2002.
Ano Pessoas
1998 6.709
1999 8.332
2000 11.126
2001 17.078
2002 23.719
No entanto, a partir daí, houve um aumento acentuado do fluxo migratório, que chegou ao patamar de 72.441 pessoas, em 2006, e 90.161, em 2007. Em termos percentuais, isso significa um aumento de 380% entre 2002 e 2007. Mas o número real, entre documentados e indocumentados, pode chegar a mais de 130 mil brasileiros, segundo o Consulado Geral do Brasil em Madrid.
Um dado interessante que merece ser destacado é a questão do gênero. Há um predomínio enorme, no caso brasileiro, da presença feminina. A imensa maioria dos imigrantes brasileiros está constituída por mulheres. É algo em torno de 66%, ou 54.598 mulheres, contra 35.563 homens. Esse é um dado que merece ser objeto de pesquisa.
Também o é o crescimento do fluxo a partir de 2002. Afinal, o que explica esse aumento vertiginoso da saída de brasileiros para a Espanha entre 2002 e 2007, em pleno governo Lula? Não deixa de ser um fato intrigante, uma vez que tem lugar justamente num período de recuperação econômica, controle inflacionário, forte geração de empregos, importante valorização dos salários, implementação de políticas públicas de grandes impactos sociais, aumento do crédito, etc. Não é uma resposta simples de dar. Seria necessário analisar o perfil dos emigrados do Brasil, as regiões de origem, as motivações, etc., para se ter uma explicação global do fenômeno.
O que se sabe é que há um conjunto de fatores. Um deles é o sonho (ou a ilusão) de se dar bem no chamado primeiro mundo. As distorções do capitalismo mundial, mais do que em qualquer outro momento, produzem e justificam a maioria dos fluxos migratórios não só do Brasil, mas de todo o sul para o norte do planeta. E a Espanha não é exceção. Fatores como os preços relativamente acessíveis das passagens para este país – se comparados com outros países europeus -, ainda mais num período de valorização do real; a ausência de visto para a entrada; o aumento do controle migratório em outros países tradicionalmente receptores de brasileiros, como Inglaterra, Portugal e Itália, forçando um desvio de rota; e a política de regularização de imigrantes são justificantes importantes. Periodicamente, a Espanha põe em marcha um plano de regularização de imigrantes indocumentados. Só em 2006, o governo regularizou mais de 600 mil pessoas. Isso, sem dúvida, é um atrativo relevante.
Mas...com a palavra os especialistas em ciências sociais.